sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

As aventuras de Pi - O filme

Limitações cinematográficas

Direção: Ang Lee
Título original: Life of Pi
Duração: 127 min
Idioma: Inglês
Lançamento: Dez/2012

Seria praticamente impossível avaliar o filme apenas pelo que ele é depois de ter acabado de ler e resenhado o livro ainda ontem, então não vou nem tentar. E para tornar uma longa conversa curta, o resumo da jornada é que a experiência cinematográfica é certamente válida, mas, como de costume, a literária é insuperavelmente melhor.

E vamos às razões (ou melhor ainda às crenças):

Parte da genialidade do livro é permitir que o leitor vá visualizando uma estória em sua mente, seja ela mais crua e gráfica, seja ela mais fantasiosa e onírica, seja ela pautada no épico ou simplesmente na descrição enfadonha e rotineira do dia-a-dia no mar. Não importa qual seja a estória que você está lendo, o dado relevante é que é uma estória que VOCÊ e só você está lendo. Você traz para a mesa seus próprios valores e crenças, assim como Pi o faz, já que a narração é em primeira pessoa.

No filme, muito já está decidido por você e a direção segue um caminho bem definido pautado pelo fabuloso, pintando com cores fortes, muita luz e muita grandiosidade os eventos que se seguem. O mar é um elemento mágico, o tigre é de uma vivacidade fantástica, ambos de uma beleza ímpar e selvagem. A presença divina manifesta-se do começo ao fim, desde as ensolaradas e bucólicas cenas dos créditos até os momentos finais.

Com tudo isso, o filme deixa muito pouco espaço para reinterpretações e releituras. Onde o livro permite uma multitude de significados e o envolvimento completo do leitor com a estória, o filme parece querer dar uma resposta "certa" e garantir um fechamento apropriado. Você só pode escolher uma das opções se aceitar ao mesmo tempo que ela não é a real e que você só a escolhe porque tudo indica que ela é a "melhor estória".

É fé baseada em escolha, não fé baseada em entrega ou em crença cega. É a fé que nasce do querer acreditar e não simplesmente do acreditar. Algo que vai contra a própria definição desse sentimento.

Algumas passagens mais fantásticas do filme são, no livro, muito mais calcadas na realidade, apoiada em tecnicismos de zoologia, botânica e navegação. No livro, a máxima com que o filme é vendido em seus pôsteres não é tão óbvia: não é necessário "acreditar no inacreditável", basta acreditar no improvável, o que é bem diferente.

Particularmente frustrante para mim, que acabara de ler o livro, foi a escolha do diretor, ainda que corajosa, de deixar que um personagem narrasse a estória em determinado momento crítico ao invés de mostrá-la, de utilizar imagens para torna-la mais real. Uma escolha deliberada que só reforça meu ponto anterior: a intenção parece ser entregar de bandeja um fechamento e só permitir ao público uma ilusão de escolha, fazendo com que muitos sintam que o final ficou "em aberto". 

Por esses e alguns outros equívocos As aventuras de Pi (o filme) nunca alcança a profundidade filosófica e o preciosismo estrutural de sua matriz literária. Está longe, porém, de ser um filme ruim. Tecnicamente fantástico, com cenários deslumbrantes e uma direção mais do que segura de Ang Lee, o filme mais do que vale a conferida, se não por todos esses bons atributos citados, ao menos pela "atuação" emocionante e verossímil de Richard Parker, o tigre que acompanha Pi em sua jornada. Um tigre para você "olhar nos olhos e enxergar a si mesmo".

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