segunda-feira, 30 de julho de 2007

O castelo de vidro - Jeannette Walls

Memórias de uma infância desajustada


Pais podem ser vilões ou heróis dependendo da luz que se joga sobre eles, do momento em que se vive ou da conveniência. Jeannette Walls consegue descrever em suas memórias situações de fazer qualquer assistente social arrepiar-se até os ossos e ao mesmo tempo ser condescendente e até mesmo (esse é o lado dela da história) magnânima na maneira como perdoa à posteriori todos os deslizes e erros dos seus nada usuais progenitores.

Crescendo de cidade em cidade, largados à própria sorte, enquanto o pai alcóolatra perdia um emprego atrás do outro e sonhava com fortunas fáceis e a mãe entregava-se à depressão e a suas manifestações artísticas, Walls e seus quatro irmãos sofrem com a fome, a insegurança, habitações periclitantes e a incompreensão (às vezes até mesmo o desprezo) do resto da sociedade.

Uma qualidade da autora é a de não se entregar a um joguinho de apontar dedos ou de não entrar em psicologia barata para justificar qualquer dificuldade atual sua ou de seus irmãos com as atitudes dos pais no passado. Ela simplesmente conta a história e tenta, na maior parte do tempo, narrar os fatos objetivamente sem julgamentos (apesar de muitas vezes não conseguir disfarçar o orgulho, ou até uma ponta de arrogância, por ter conquistado uma posição na sociedade apesar de todas as situações em que os pais os colocaram.

O livro pode chocar alguns leitores mais sensíveis porque, apesar de a autora oferecer pequenas histórias supostamente cômicas ou emocionantes, pode-se também lê-las como relatos factuais de negligência e abuso infantil, como a indiferença paterna aos avanços de homens mais velhos sobre uma de suas filhas adolescentes enquanto esses garantiam o dinheiro necessário para mais uma dose. Nesse cenário, fica difícil não torcer pelas crianças e por capitulos mais alegres e "seguros" para eles (o que você sabe que vai acontecer pelo menos com a autora já nas primeiras linhas do primeiro capítulo).

Com uma prosa fácil e descomplicada, capítulos no tamanho exato de um deslocamento para o trabalho e personagens que mesmo assustadores, tornam-se apenas "peculiares" na descrição afetuosa e aparentemente sem rancor de uma filha, O castelo de vidro é uma leitura agradável e descompromissada para ler aos poucos e aproveitar cada momento da estranha infância dos irmãos Walls. 

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